2011/05/22

último rascunho

Este texto nasceu para ser um rascunho mesmo, faz parte de um texto maior que está (permanentemente) suspenso até que eu, talvez um dia, mude de ideias e o acabe. Bem esse texto deveria ser a procura por um estilo de escrita agradável, comercial até, que serviria para ligar um tópico mais forte de análise cultural. Mas que se lixe o paleio! Eis a coisa:

"Podemos ter tudo quanto sonhamos. Ou sonhar que temos tudo… Na realidade, tudo o que queremos, já temos. Nem sabemos como conseguimos a maioria das coisas. Mas conseguimo-las. E o resto? O que acontece com o resto?
Passadeiras… Semáforos e pessoas. Todos esperam pelo sinal automático e espectacular do boneco verde do outro lado. É um momento quase único, todos são livres então. São os pigmeus verdes e luminosos que trazem a verdade do momento. São eles que dão a liberdade de se poder fazer o que se anseia. E eu ali, a querer atravessar. Nós ali, à espera do momento certo para correr. Mas parados, sem poder controlar o tempo, sem poder fazer nada mais do que carregar o botão do “anda lá”, o comando “despacha lá isso de uma vez” que todos fazem questão de activar. E nada mais. Um momento de espera e ansiedade à espera de um homenzinho verde que parece ter ficado retido no trânsito ou isso seja só uma desculpa por ter adormecido por já não ter mais paciência para se cruzar com um chefe vermelho de raiva. Chega mais gente, o passeio começa a transbordar pessoas para a estrada. E o homem verde não chega. Buzinas em vez de travões protegem mais um aventureiro que se antecipa. E todos vêm, já ninguém se aventura até ao vadio esverdeado chegar.
Mais gente, os dois lados apinham-se em ansiedade e impaciência. Paciência! Deixem os carros passar. As buzinas intimidaram as pessoas, ninguém passa. Para quê chamar-lhe passadeira então? Agora não o é, na verdade. E eu ali, na “esperadeira” a passar o tempo que não quer passar. Todos começam a estremecer, há uma novidade. Os carros estão a parar, sinais do tempo, não haja dúvida. Já passou bastante desde que a espera começou. O profeta anuncia a boa-nova, por fim, “foda-se, ‘tava a ver que não!” e o homem de verde surge e a multidão avança, destemida, para a estrada. Haveria alguma revolução hoje? Porquê tanta gente aqui? Deixemos isso a quem quiser saber, agora o que interessa é atravessar a estrada, livremente, a par de todos.
A caminhada apressada complica-se a meio, há sempre o outro lado na passadeira. Mas segue-se o caminho da liberdade. Um “com licença”, dois ou três “desculpe lá”, uns encontrões e está feito. Um emaranhado de gente livre a querer atravessar já sem saber ao certo para onde ir, o importante é atravessar. Mais encontrões, uns “desculpe”, dois “com licença” e estamos do outro lado. Agora pergunto-me o que faço eu aqui no meio de tanta gente. Há que seguir, o profeta e o sagrado luminoso verde ordenam-me que avance. E, de repente, dou por mim do outro lado. Parado, de costas para o tão esperado homem verde que me abandona cintilante."

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